sábado, 12 de setembro de 2020

Setembro com outra cor

Setembro, além de amarelo, é roxo. Ou seja, além da prevenção de suicídio e cuidado com saúde mental, 2020 também tem a campanha sobre a fibrose cística. Dia 8 de setembro foi Dia Mundial da Fibrose Cística, e eu não posso dizer que entendo a doença - eu não tenho, não conheço quem tenha, não sou médica, não necessariamente estudei para isso at all -, mas algo que aconteceu nessa pandemia me deu vontade de escrever esse post.

Num resumo bem aleatório, eu troquei de celular e, com o novo, ganhei (?) quatro meses de Youtube Premium, que inclui o Originals. Sendo bem sincera, Youtube Originals nunca me interessou, eu sei que o Burn The Stage está lá e tem uma série curtinha do BIGBANG também, mas era meio que isso. Um dia, porém, um vídeo apareceu entre os indicados e, depois descobri, era um mini documentário publicado no Originals.

Claire Wineland era uma força da natureza. Dos 13 aos 21 anos, ela manteve um canal no Youtube postando vídeos explicando o que é ter fibrose cística, como é conviver com a idéia de que o tempo corre mais rápido para ela do que para muitas outras pessoas e, desde o nascimento, ter um "prazo de validade" que nunca tinha como saber se seria mesmo o final - até os seis anos, até os dez, até os 15, até os 18, até os 23.

Os vídeos, além de falar sobre a vida dela como alguém doente, são um belo tapa na cara de pessoas como eu, fisicamente saudáveis que inventam desculpa em cima de desculpa para a maneira como minha vida é agora. Para não melhorar, não correr atrás de nada, não me mexer. Ela conta como, desde pequena, ela não sabia qual exatamente era o objetivo da vida dela, porque crianças doentes só aparecem em propagandas de ONGs e "por favor, doe dinheiro", e ela não queria sobreviver só por sobreviver - porque, no caso dela, sobreviver não era fácil, era uma sequência de cirurgias "de rotina", semanas passadas no hospital e diversas limitações.

A Claire de onze anos ganhou um livro do Stephen Hawking, e ficou encantada ao descobrir que ele tinha uma doença tão frustrante e devastadora quanto a dela, e mesmo assim se tornou um dos mais respeitados físicos que o mundo moderno viu. Aos 13, ela foi para uma cirurgia de rotina e teve falência dos pulmões, e contrariando todas as probabilidades, sobreviveu. Ao acordar do coma, uma das primeiras coisas que ela fez foi criar a Claire's Place Foundation, porque uma coisa que ela percebeu foi que pessoas com fibrose cística não conseguem muita qualidade de vida também porque o dinheiro arrecadado é direcionado para pesquisas para uma cura, e não para a qualidade de vida de quem está aqui, no presente. A idéia inicial era bem simples, dar a outras crianças a oportunidade de viajar e passear como ela conseguia - dar apoio para pais cujos filhos têm fibrose cística.

Aos 19 anos, ela era fonte de inspiração não só por todo o trabalho, mas pela imagem mesmo. Como ela própria falou em TED Talks e no documentário, a Claire de 20 anos virou justamente a heroína que a pequena Claire de cinco anos precisava para se inspirar. Alguém que estava vivendo uma vida da qual ela tinha orgulho, fazendo valer o tempo que tinha de vida, independente de quanto tempo isso fosse no final. Alguém que não se limitava a ser uma pessoa doente, e que conseguiu dar algo de volta para as pessoas, estabelecer um legado que deixa o mundo melhor, mesmo que ela não possa aproveitar.

Aos 21 anos, o pulmão dela chegou no point of no return e ela precisou de um transplante. A cirurgia correu bem, mas ela teve um infarto e não resistiu. Nunca voltou da anestesia da cirurgia. A família mantém a fundação, e os canais no Youtube seguem online, tanto o com vídeos que ela postou quanto o que a família cuida, postando vídeos antigos e o próprio documentário.

Ao mesmo tempo em que a história dela é um tanto triste e muito injusta, é linda e inspiradora. Entre os videos da Claire, vários falam sobre o relacionamento dela com a morte, e como ela lidava com essa consciência de que a morte dela provavelmente chegaria muito antes - inclusive vídeos com a família dela, perguntando como eles conviviam com a doença e a gravidade.

Claire é uma daquelas pessoas raras cuja vida e legado são muito maiores que o pouco tempo que estiverem por aqui. Para mim, deu uma perspectiva totalmente diferente não só da doença que eu não conhecia, mas de como reagir e tratar pessoas doentes, principalmente crianças. E como me tratar também - damn, eu tenho 30 anos e não tenho tanta coisa da qual me orgulharia, além de uma lista de arrependimentos que eu deixaria para trás.

Se você estiver com algum tempo livre, eu absolutamente recomendo que você assista a palestra dela, e, se tiver como assistir Originals, veja o documentário aqui, dos últimos 18 meses de vida dela, que tem legenda em português, aliás.



Aqui no Brasil, estamos no setembro roxo, esse ano com o tema "A gente te entende" - distanciamento social, alcool em gel, máscara? Fibrose cística exige esses cuidados diariamente, com ou sem covid-19. Você pode ver mais sobre o setembro roxo aqui no Unidos Pela Vida, que tem informações sobre a doença, história de pessoas que convivem com a doença, notícias, conquistas e área para doar.

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